Julia amava intensamente. Viceralmente. Das tripas coração.
Com a mesma intensidade, Julia sofria. Queria cortar os pulsos, queria tomar cicuta, jogar-se pela janela. Com ela não havia meio termo.
Então, no dia em que Julia encontrou Marcelo decidiu que tudo seria diferente. Ela mordia a língua e rangia os dentes para evitar a intensidade constumeira. Segurou-se uns dois meses antes de falar eu te amo baixinho e tímido no ouvido dele.
Encantado, Marcelo decidiu casar.
Com a data marcada, ela de vestido branco e lírios nas mãos, casaram-se apenas no civil.
Infinitos cinco meses de pura alegria.
Marcelo bebia e Julia não sabia.
No primeiro porre, ela decidiu que era hora de parar de morder a língua e começar a quebrar a louça. No final daquele ano eles já comiam em pratos de plástico.
Ele pedia perdão antes mesmo de chegar em casa, e ela quebrava os copos só de pensar em cachaça.
Sentado no chão do box, ele implorava, dizia que nunca havia conhecido alguém como ela, de tal controle e meiguice. Culpava-se por ter destruido a vida de Julia.
Ela, por sua vez, fazia pequenas incisões nas coxas, com um canivete que sua tia havia trazido da Suiça.
Marcelo tentou de tudo. AA, igreja, trabalho voluntário. Nada conseguia afastá-lo do enorme prazer que vinha em pequenas doses.
Decidiu que era hora de deixar Julia ser feliz. Pediu o divórico.
Julia nunca pensou que se separaria na vida. Para ela casamento era um vínculo eterno. Eternamente 18 meses.
Questionou a ingratidão de Marcelo e arrancou a saia, mostrando os cortes que impediram-lhe de matar seu amado marido durante aqueles meses.
Marcelo ficou sóbrio na mesma hora. Como era possível que Julia, tão equilibrada, chegasse aquele ponto. Apaixonou-se de novo. Percebeu que não estava sozinho em sua solidão de ser dois e decidiu adiar o divórcio.
Para Julia, na verdade, tudo aquilo era maravilhoso. Uma desculpa perfeita para viver intensamente, em cada suspiro, em cada gota. Viceralmente.

Comentários

Anônimo disse…
Olá! Eu sei do livro porque tive um microconto publicado. E estou passando pelos blogs dos autores que disponibilizaram para conhecer seus trabalhos. Até mais!
Anônimo disse…
Se for pra se cortar, que seja em alto estilo, com canivete Suíço.. eu sou do time da Júlia, mas tenho pena de quebrar os pratos... são tão caros.

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